O nascimento da criança divina

Por Ir. Silvia Cristina Maia, CR 

José subiu com Maria, que estava grávida, para inscrever-se em Belém. 
“Enquanto lá estavam, completaram-se os dias para o parto, e ela deu à luz seu filho primogênito. (Lc 2 4-7)

O nascimento de uma criança é sempre um evento que nos comove, nos traz algo de novo e nos tira de nossas comodidades. Com Jesus não foi diferente. O seu nascimento desestabilizou não só a família mas também o sistema de governo, a religião, os relacionamentos etc. Tendo presente isso, queremos abordar neste artigo o nascimento da criança divina, não somente aquela que nasceu em Belém numa noite fria, mas daquela criança divina que deixamos nascer dentro de nós por meio das nossas primeiras representações de Deus. 

É através dessas representações de Deus que aos poucos vamos tendo contato com os sentimentos que, no decorrer de nossas vidas, serão direcionados a Deus, sentimentos como amor, confiança, conforto, proteção e segurança. De que forma então o bebê tem contato com esses sentimentos?

Ele só pode fazer a experiência desses sentimentos porque a representação de Deus está  intimamente ligada à presença da mãe na relação com a criança. Segundo Ana Maria Rizzuto, a mãe é aquela em quem o bebê se apega, e representa sua segurança, é seu absoluto, a mãe, portanto,  é “o primeiro deus” da criança, ou melhor, o primeiro “símbolo de Deus”. É ela quem, para ele,  tem o poder da vida e da morte. Portanto, quando a mãe irradia confiança, a criança então desenvolve confiança. Quando a mãe irradia insegurança, a criança desenvolve-se insegura e assim por diante. Isso implicaria que a criança, diante de Deus, desenvolveria sentimentos de segurança ou insegurança respectivamente na relação com Deus. 

Com o que foi dito até aqui, podemos perceber a complexidade e a importância das primeiras relações entre a mãe e seu bebê. Podemos inferir também sobre a grandiosidade e sacralidade que existe nas primeiras experiências relacionais que constituímos em nossa vida, ou seja, mãe e pai, ou ainda, quem dispensou-nos cuidados. Essas pessoas significativas nos marcaram com os traços de Deus.

As primeiras “imagens de Deus” que geramos dentro de nós por meio das nossas primeiras relações significam o nascimento da criança Divina em nós, ou seja, como diria mais uma vez Rizzuto, “O nascimento do Deus Vivo”.

Não importam as condições nos quais se encontram os pais e as crianças no dia do seu nascimento, mesmo diante das contingências da vida o importante é que cada ser humano tenha a graça de ser acolhido por uma mãe como Maria, um pai como José e uma manjedoura calorosa e cheia de afeto que proporcione a cada ser que nasce a possibilidade de ser marcado com os traços Divinos, e assim, por sua vez, possa também gerar dentro de si o Deus Menino.

A loucura da Hóstia

Gostaria de expressar o sentimento profundo de que todos vocês possam ir descobrindo este caminho que faz parte de nossa experiência de vida, de muitas cores, de muitas dores, cruz que faz sombra, abrigo amoroso. Por isso Senhor Jesus queremos contemplar, queremos mergulhar nossa vida na sua interioridade passando por essa cruz. Sim Pai tua santa vontade, a vontade do Pai.

Para todos vocês também, meus queridos, a vontade do Pai, muitas vezes, pode ser o caminho da cruz. Não tenham medo, não tenham medo de se lançar nesta vontade, neste desígnio, desejo profundo de realizar a vontade do Pai, não existe Páscoa sem cruz, ressurreição sem cruz, as nossas pequenas e grandes cruzes de cada dia imoladas no altar de nossa vida, se fará lar de Jesus, fonte perene da Copiosa Redenção.

Também hoje quero falar para vocês da loucura da hóstia, a vida interior que contemplamos em nós, em nós contemplamos Cristo sinal vivo, sacramento de amor, apaixonado de amor quis ficar conosco na pequena hóstia. Nossa força viva. Não há maior prova de amor que dar a vida por aquele que amamos, uma única vez. Ele nos dá essa vida, todos os dias, todos os instantes, a cada instante que paramos diante d’Ele já nos dá esta vida espiritualmente, cada dia nos dá sacramentalmente.

Senhor queremos entender, queremos alcançar o voo que nos leva até junto da plenitude desta compreensão e não podemos voar tão alto. Queremos Senhor que o caminho de nossa interioridade passe pela patena e pelo cálice. O caminho de nossa interioridade também nos faz oferenda no altar, não existe vida interior que não tenha que nascer no altar, penhor da entrega total.

Cada membro da Copiosa Redenção se coloque na patena, se coloque no cálice, na imolação de todos os dias, e junte a hóstia por loucura, ser no mundo sinal, ser no mundo sacramento vivo da Copiosa Redenção.

Carinhosamente de seu Pai espiritual.

(Último trecho da carta escrita em 23 de maior de 1994)